Entrevistamos Hilda Scarcella, especialista em coaching de executivos, para entender a gestão de conflitos nas organizações e como realizar de forma efetiva em um século onde a adversidade ganha espaço e as gerações X, Y e Z convivem no ambiente profissional.
Segundo Scarcella, o conflito é natural e inerente ao ser humano. Afirma ainda que o importante é desenvolver a gestão de conflitos nas organizações de maneira eficiente em busca de resultados cada vez mais produtivos e diferenciados.
Antes de tudo, nesta entrevista para a EAD360graus, a especialista aponta como o gestor deve se preparar para lidar com os desafios das novas organizações, fala sobre as gerações baby boomer, X,Y e Z, dá dicas sobre como fazer uma administração de conflitos de resultados e mais.
Acompanhe!
Entrevista
Quais os principais tipos de conflitos encontrados em uma empresa?
Hilda Scarcella – Veja só, considero três como principais: intrapessoal, interpessoal e intergrupal. No meu curso Gestão de Conflitos detalho bem cada um deles e como eles podem impactar uma organização inteira. Mas você também pode dar uma olhada no meu artigo “Conflitos Organizacionais: natureza e impactos” para entender o assunto de forma mais ampla.
Poderia explicar de forma resumida cada um deles?
Hilda Scarcella – Claro! O conflito intrapessoal é aquele que ocorre dentro da personalidade de um indivíduo. É como se fosse um confronto interno, quer seja ele com relação a ele mesmo ou ele com relação à empresa.
Antes de tudo, todo individuo carrega um conjunto de fatores, crenças e valores. Carrega também experiências do passado, princípios éticos, morais e uma visão muito própria do mundo. Visão essa que pode gerar conflitos consigo mesmo ou com o lugar onde trabalha.
O outro conflito é o interpessoal que é o conflito entre pessoas. Seu limite é a incapacidade de se comunicar.
E, para finalizar, vem o conflito intergrupal, que é o conflito entre grupos. Dentro de uma empresa, esse cenário pode estar relacionado a conflitos entre áreas, por exemplo, vendas e produção.
Olhando o seu curso Gestão de Conflitos, encontramos nele um perfil de gestor denominado “Criador de Búfalos”. O que seria um criador de búfalos? Ele ainda existe? No que esse tipo de perfil impacta?
Hilda Scarcella – Em princípio, o que caracteriza o executivo “criador de búfalos” é um perfil totalmente controlador. Ele não dá autonomia para as pessoas. Ele não leva as pessoas para a postura de independência no sentido de enfrentar um conflito. Ele não leva as pessoas a tomar iniciativa, a ter uma certa autonomia, de se apropriar do seu trabalho e se responsabilizar.
Hoje, a maioria de profissionais no mercado são pessoas da geração Y que quererem crescer, evoluir. Logo, querem responsabilidade, autonomia e ser desafiadas.
E hoje ainda tem muitos profissionais “búfalos”, por vários motivos. Por exemplo, insegurança pessoal, medo de perder a cadeira, por acreditar que ninguém pode fazer melhor que ele. Os motivos são vários. Ele não quer que o colaborador crie, desenvolva, quer apenas que ele faça como foi pedido. Com um gestor assim, o trabalho não cresce.
Como fazer para identificar se há conflitos sérios que podem levar a empresa a ter prejuízos nos negócios?
Hilda Scarcella – Antes de mais nada, identifica-se pela dinâmica comportamental das pessoas, pela dinâmica dos relacionamentos entre as pessoas. Na hora que começa a ter um grupo, ou pessoas dentro do grupo com o comportamento indiferente, apático, alienado dos problemas, com hostilidade, com agressividade ou sarcasmo, está claro que tem um conflito acontecendo ali.
O gestor tem que ter este olhar, estar sensível a isso. Hoje só o resultado não basta.
Como você vê as novas gerações no ambiente de trabalho?
Hilda Scarcella – Cada vez mais se vê a geração Y e também Z no mercado de trabalho, e elas não estão preocupadas com estabilidade. Elas querem crescer, querem desafios, feedback e justiça.
Quando eu pergunto em aula o que elas querem ser, a resposta é o que elas querem ter agora. Por exemplo, férias de 30 dias, dia de home-office, horário flexível. Elas querem ser felizes agora. Conciliar o trabalho e o bem-estar. Querem ter prazer no trabalho.
Antes de tudo, essas gerações só ficam se a empresa estiver agregando valor à vida delas, pois querem ser produtivas, falar, fazer, ter autonomia, desafios. Não existem fronteiras para elas, se relacionam com todos, em todos os níveis hierárquicos e têm grande capacidade de se adaptar. Para elas não importa o perfil do gestor. O gestor só precisa saber aproveitar todo o potencial dessas gerações. E se isso não acontece, elas vão embora e levam junto as competências da empresa.
Em virtude do convívio profissional entre diferentes gerações, você acredita que a maneira de fazer gestão de conflitos nas empresas é a mesma para todas essas gerações ou a gestão de conflitos tem de se adaptar ao perfil de cada geração?
Hilda Scarcella – Antes de mais nada, pense assim: não dá para rotular. São pessoas e cada uma tem sua identidade independente da idade. Podemos ter um baby boomer com 60 anos que tem uma cota de perfil Y. Assim como o contrário. Logo, não é a idade que define a pessoa.
Fazer gestão de conflitos nas organizações não tem a ver com gestão de idade tem a ver com a identificação dos valores do outro. Saber como ele funciona.
Primeiramente, tem que ser empático. Tem que entender o modelo mental do outro e a condição que o líder tem de influenciar positivamente porque hoje o conflito de gerações é inevitável.
A empresa mudou e muda continuamente, o gestor tem que se tornar mais versátil. Em suma, para fazer a gestão de conflitos é preciso estar atento às pessoas, saber agir e se comunicar com elas, independente da geração.
Fazer gestão de um conflito exige preparo? Se não, por que não? Se sim, por que e como se preparar para gerir um conflito?
Hilda Scarcella– Sim, exige um aprendizado contínuo em todas as direções. Estar atualizado, perceber que o mundo mudou, estar sempre em desenvolvimento, olhar para as pessoas e entender que quanto mais lidar com as pessoas de forma saudável e produtiva melhor vai ser a performance.
Antes de tudo, tem que se capacitar. Tem que fazer cursos presenciais ou cursos online, leituras rápidas, buscar na internet vídeos que têm ideias legais. Mas, é importante saber avaliar também o que se estuda, lê e assiste, porque alguns são simplistas demais, não contribuem. Já outros contribuem muito.
Qual leitura você acha indispensável para quem quer aprender a gerir conflitos?
Hilda Scarcella – Inteligência Emocional do Daniel Goleman é um livro imperdível, mas gosto também de leituras práticas como a revista Você S/A. Ela é pragmática e já te dá recursos. Vale a pena buscar os temas abordados na edição. Por exemplo, se a edição fala de liderança, feedback, comportamento, assuntos que te interessam naquele momento, pare para ler.
Outras sugestões são artigos no digital como o “Gestão de conflitos: como realizar de forma eficiente”. Enfim, tudo é aprendizado e quanto mais contínuo melhor.
Mas o mais importante é a atitude, alinhar teoria com a prática. E a prática está no dia a dia. O conhecimento teórico precisa vir para a prática.
Indique algum filme que possa exemplificar bem o conflito e a gestão de conflitos no ambiente de trabalho aos nosso leitores.
Hilda Scarcella – Coach Carter – Treino para a vida. Esse filme é a história real de Kenny Ray Carter, o dono de uma loja de artigos esportivos que aceita ser o técnico de basquete de sua antiga escola. Mas, por impor um regime rígido, começa a ter conflitos com os jogadores que estavam habituados a um regime permissivo. O filme vale muito a pena, principalmente porque mostra uma gestão de conflitos com resultados positivos para todas as partes.
Como é o perfil de um bom gestor de conflitos?
Hilda Scarcella – É o profissional que tem o olhar para pessoas e não só para resultados. Ele tem interesse pelas pessoas, em desenvolver o time. É coerente, tem empatia. Consegue manter a qualidade de contato. Tem respeito, espírito de time, desafia, acompanha, dá feedback. Em suma, faz tudo com um olhar de gestão contínuo e sinérgico.
Em princípio, sempre vamos voltar para as questões comportamentais. Por isso que Goleman coloca que o sucesso hoje não está na competência técnica, o determinante hoje é a competência emocional.
Que 5 dicas você daria para uma gestão de conflitos eficiente?
Hilda Scarcella – Vamos lá!
1. Separar as pessoas do problema
Antes de mais nada, para fazer a gestão do conflito é preciso entender o que está acontecendo. Afinal, tem que focalizar questões básicas do conflito. Por exemplo: Qual é a situação? Qual é o fato? Qual é a causa? E separar a causa do efeito.
Por exemplo, se existe um conflito porque uma pessoa é agressiva, isto é efeito. O que leva a pessoa a ter o comportamento agressivo é a causa.
2. Evitar posições radicais
Sim, não. Concordo, discordo. Sou contra. Afinal, isso gera uma relação dominador x dominado, quando um quer provar que está certo. Em síntese, a pessoa fica surda para a fala do outro.
3. TER INTERESSE E Considerar a opinião e o sentimento da outra parte
Desde já, é preciso lidar com isso, porque se não ouvir, se não der importância para a outra parte vai desencadear um sentimento que pode ser raiva, de deixa para lá, de descaso, de humilhação, de apatia, de revolta, de não vale a pena, de desesperança. Isso tudo vai ser efeito de como o gestor vai lidar com a opinião do outro.
4. Ouvir a objeção, a discordância da outra parte com atenção
Antes de tudo, ter atenção e curiosidade. O que ele está vendo que eu não vejo? O que o outro considerou ou desconsiderou que eu não estou levando em conta?
Primeiro é preciso ouvir empaticamente e respeitosamente. E, depois, identificar qual é a expectativa.
A princípio, não é uma questão de certo e errado. Afinal, esse não é um momento de atacar ou de tentar convencer o outro. Quanto mais informação o gestor tiver, melhor e mais efetiva vai ser a solução.
5. Definir responsabilidade para a solução
Em princípio, o objetivo é comum, quem está dentro do conflito quer a mesma coisa, uma solução melhor para a situação. Afinal, diante do conflito é preciso analisar o que pertence a cada parte e o que pertence a ambos no sentido da responsabilidade.
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